Brasil é o segundo país no mundo em número de cirurgias estéticas. A busca por um padrão de beleza idealizado pode causar problemas como hemorragias, infecções, trombose e má cicatrização

Segundo pesquisas, 98% das mulheres se sentem incomodadas com seus corpos

O Brasil é o segundo país no ranking de cirurgias plásticas realizadas. Em 2011, foram mais de 905 mil procedimentos, segundo pesquisa realizada pela Sociedade Internacional de Cirurgiões Plásticos para Estética (Isaps, The International Society of Aesthetic Plastic Surgeons ). Se fizermos uma relação com o número de habitantes no país, são 4,6 cirurgias a cada mil habitantes (1).

Carlos Komatsu, cirurgião plástico e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, acredita que um dos fatores que contribuíram para esse aumento foi o crescimento da classe média. “As pessoas passaram a ganhar mais, por isso começaram a se preocupar com coisas que antes não podiam: passeios, viagens e beleza, por exemplo. A preocupação com a estética cresceu muito, e isso vale para o consumo de cosméticos, maquiagem, produtos dermatológicos e cirurgias plásticas”, enumera.

Outros fatores também impulsionaram o crescimento do mercado de cirurgias plásticas no Brasil. A busca por um corpo ideal e a rejeição de características que fogem ao padrão de beleza dominante estão entre eles. “Há uma busca desmedida por esse padrão de beleza massificado que, na maioria dos casos, é biologicamente impossível de ser alcançado”, pondera a psicóloga Marcele Avellar Pantoja. “Essa busca obsessiva acaba desfigurando a tênue linha entre o cuidado saudável com o corpo e o sutil movimento de instalação de doenças.”

A psicóloga alerta para o fato de que esse padrão já se incorporou ao subconsciente das pessoas, tanto que, segundo pesquisas, 98% das mulheres se sentem incomodadas com seus corpos, algumas a ponto de não se sentirem bonitas (2) (3).

“A cirurgia plástica é um tratamento médico e não um modismo”, lembra Dênis Calazans, cirurgião plástico e secretário-geral da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP). “É imperativo que haja necessidade, quer seja emocional, pelo desconforto que alguma alteração física traga, quer seja funcional.”

Riscos

Como todos os procedimentos cirúrgicos, a cirurgia plástica requer cuidados especiais e possui riscos. Hemorragias, tromboses e perda de sensibilidade local são algumas das consequências que a operação pode trazer. O pós-operatório da maioria dos procedimentos exige muitos cuidados e resulta em limitações.

Para que o sonho estético não se transforme em pesadelo, é importante repensar a necessidade da cirurgia e ter consciência de que ela não é a única solução para problemas de autoaceitação.

Estudos mostram dados preocupantes em relação às consequências psicológicas para as pessoas que não se enquadram no perfil/padrão estético globalizado de beleza (3). “A busca pela magreza, pelo corpo perfeito e escultural afeta diretamente a autoestima e pode desencadear transtornos alimentares, entre outros problemas”, lembra Marcele Avellar Pantoja, psicóloga.

Não é corte de cabelo

Os médicos afirmam ainda que há pacientes que entendem a cirurgia plástica como algo parecido com um corte de cabelo ou troca de roupa. Nestes casos, o médico deve ter bom senso e recusar o procedimento. “Algumas pessoas acham que conseguem resolver seus problemas psicológicos com uma cirurgia, quando, na verdade, precisam é de um tratamento psicológico”, afirma Calazans. “O cirurgião plástico deve ser ético o suficiente para recusar o procedimento e explicar seus motivos para tal.”

Perigos da cirurgia

Todo procedimento cirúrgico possui riscos. Por isso, é importante que se discuta todas as possíveis complicações que podem ocorrer antes, durante e após o procedimento durante a conversa com o cirurgião. Segundo a Mayo Clinic, uma organização norte-americana especializada em pesquisas médicas, as complicações podem começar pela anestesia. Complicações podem causar pneumonia, trombose, alergia e levar à morte (4).

Pessoas com diabetes, hipertensão, doença cardiovascular, pulmonar e obesidade estão no grupo mais propenso a problemas como pneumonia, acidente vascular cerebral, ataque cardíaco ou trombose. Fumar também aumenta os riscos e interfere na cicatrização.

A idade do paciente é um fator de risco a ser considerado: quanto mais velho o indivíduo, mais chances de o corpo não reagir como o previsto. Nesses casos, recomendam-se exames pré-operatórios mais investigativos. O risco mais grave e geralmente fatal é o tromboembolismo pulmonar (TEP), relacionado à trombose venosa profunda, quando coágulos sanguíneos chegam ao pulmão, condição associada a fatores de risco do paciente.

É importante lembrar que cada tipo de cirurgia plástica possui um risco específico, por isso é importante discuti-lo com o médico e saber se existe algum outro risco relacionado a sua condição de saúde. Em cirurgias em que são necessários pontos, há risco de infecção no local, formação de queloide, má cicatrização ou mesmo ruptura dos pontos. Nos casos em que são utilizadas próteses, pode haver rejeição.

Antes e durante a cirurgia

Alguns cuidados antes da cirurgia são recomendados pela Associação Americana de Cirurgias Plásticas Estéticas. Se o paciente for fumante, ele deve parar de fumar pelo menos um mês antes do procedimento. Aspirina e alguns medicamentos anti-inflamatórios podem causar aumento de sangramento, por isso aconselha-se evitar estes medicamentos antes da cirurgia (5). Infecção no local da incisão e infecção hospitalar podem piorar a cicatrização e exigir uma cirurgia adicional.

Na cirurgias de mama ou com outros implantes pode haver rejeição da prótese, ou deformação da mesma, o que pode levar a uma segunda cirurgia para corrigir o problema. Na mama, há risco de perder a sensibilidade nas auréolas. No caso da lipoaspiração pode haver sangramento interno, perfuração de algum órgão, hematomas.

Uma forma de minimizar os riscos da cirurgia plástica é realizar uma consulta prévia com o anestesista. Pacientes com maior risco que se consultaram com anestesistas conseguiram mais desfechos positivos, segundo pesquisa realizada no Hospital Sarah Brasília (6).

Pós-operatório

Os riscos não acabam na sala de cirurgia. Após o procedimento estético, perigos como o acúmulo de líquido sob a pele (seroma), sangramentos leves ou hemorragia interna, hematomas, dormências e formigamentos causados por danos aos nervos e perda da sensibilidade no local da operação podem trazer incômodos.

Nos primeiros dias após a cirurgia o paciente deve fazer repouso quase absoluto. Durante as primeiras 48 horas haverá muitos hematomas e inchaços na região operada. Os hematomas devem desaparecer em até 10 dias. Para dor, recomenda-se evitar anti-inflamatórios à base de ácido acetilsalicílico, pois são anticoagulantes.

É preciso movimentar-se com cautela. Andar um pouco, no entanto, também é importante no momento da recuperação do paciente. Ir ao banheiro ou sentar-se à mesa para comer são movimentos que ajudam a diminuir os riscos de trombose nas pernas (5).

Outro cuidado é evitar a exposição solar até a completa cicatrização da cirurgia. Isso porque a exposição pode aumentar as chances de hiperpigmentação na área, o que deixa a cicatriz mais escura do que a pele ao redor.

Cresce o número de plásticas em adolescentes

A ética médica deve ser seguida de forma ainda mais estrita quando se trata de adolescentes candidatas a uma cirurgia plástica. É um momento em que corpo e a mente passam por grandes mudanças e muitas vezes o que se pretende é a aceitação dos colegas. Em busca dela, garotas de 15 anos buscam a mesa de cirurgia para colocar silicone nos seios.

O número de cirurgias plásticas em adolescentes com idade entre 14 e 18 anos mais do que dobrou em quatro anos. Se em 2008 foram 37.740 procedimentos, em 2012 o número saltou para 91.100, segundo dados da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica (SBCP) (7).

Especialistas afirmam que não há idade mínima para se realizar uma cirurgia plástica, mas em procedimentos como implante ou redução de mamas, é necessário esperar que o corpo do jovem tenha se desenvolvido completamente. “Isso ocorre por volta dos 17 ou 18 anos. É quando eu costumo recomendar a cirurgia a meus pacientes”, explica Komatsu. “Mas há alguns procedimentos que devem ser feitos durante a infância ou início da adolescência, como no caso de correção de orelha, ou orelha de abano, como é conhecida popularmente”, completa.

“Nos casos de cirurgia em adolescentes os pais devem ter a palavra final. Devem decidir da seguinte maneira: é realmente necessário esse procedimento ou é apenas para estar na moda, um capricho de momento? Se a resposta for a segunda opção, é recomendado esperar um pouco mais”, finaliza o cirurgião.

Profissional especializado

Para ser cirurgião plástico, o profissional precisa passar pelo curso de medicina – seis anos –, pela residência em cirurgia geral – dois anos – e pela especialização em cirurgia plástica – dois ou três anos. Depois, tem de ser aprovado em um exame específico para ser aceito na SBCP, que conta hoje com cerca de 5.500 de cirurgiões cadastrados.

O Conselho Federal de Medicina, em sua resolução, afirma que um médico, ou seja, aquele graduado em medicina, pode realizar qualquer procedimento médico. Portanto, um médico não especializado não estará agindo ilegalmente se fizer uma cirurgia de nariz, por exemplo. “É como se você fosse fazer uma cirurgia de coração com um ortopedista. Ninguém pensaria duas vezes neste caso, portanto, não se deve pensar também no caso da plástica,” explica Komatsu.

Foto: CharlotteAstrid / Flickr: CharlotteAstrid / CC by 2.0

Fonte: NAMU

Deixe seu comentário

WhatsApp chat